domingo, 24 de agosto de 2008

Segredos e sinceridade

A alma do lobo


Nasci sobre a benção de Antares
Mistério é reduto em minha alma
Névoa e neblina meu tempo predileto
Bosque e campina meu habitat mais conhecido
Viagem e comida meus prazeres menos secretos
Oculto e escondido meus estudos discretos

Volto
Novamente
A falar de mim
Egoísmo não é a chave do meu sucesso
Nem a eloqüência nem a veracidade
Não tenho chave
Derrubo ou contorno as portas
Entro pela janela

Não pergunto nada
Rondo a garota deitada
Adormecida sonhando na cama
Vou até a cozinha
Pulo sobre a mesa
Faço barulho nas panelas
Abocanho
E saio
Fujo orgulhosamente
Dizem:
O lobo porque não devorastes?
Eu digo
Só queria algo para jantar
Gosto de salame

Ele sai
Jovem e austero
Sincero e gentil ele sai
Ele some
Como lua nova no céu
Desaparece
Ele retorna
A tempo de saber que descobriram algumas coisas
Que sabem de seus segredos
Tolos
Ninguém sabe de nada
Só sabem o que ele quer que saibam
E isso o deixa contente
Faz com que se sinta poderoso
O eleva ao grau das estrelas

Seus planos são intuitivos
Seu carisma é um feitiço antigo
Relíquias de outras vidas
Que soube muito bem resgatar

As barbas brancas
As cicatrizes só aumentaram
Perdeu pelo
Ganhou peso
O joelho direito já não se comporta bem

Pródigo filho
Retorna como pai
Vencedor de batalha
Arrebanhador de fiéis
Continua intermitente
Importante
Experiente

Sabedor
Ele visita o antigo chalé
Tomado pelas teias e aranhas da descrença
Toca o resto das flores
Senta-se na antiga varanda
Deita no jardim

Quanto tempo se passaram
100 anos
1000 anos
ninguém nunca saberia da guerra se ele não a anunciasse
estava fadado
sabia que jamais entenderiam seu propósito
sua missão
nem os que prezava

levanta-se
horas homem horas animal
olhar de fera
em domínio de gente
astúcia de rei
em domínio de dentes
ninguém mais vive ali
imagina o novo vale o novo campo
para qual se mudaram
quantas famílias se passou
quantas já teve?

Nem ele sabe
Embora nunca admita isso para si mesmo
Ele defende-se da mesma maneira que se ataca
É um paradoxo sobre duas e quatro patas

Orgulha-se disso
Seus defeitos são suas maiores qualidades
Ele tem sim o escondido
Tem também a fidelidade
Traz sim o veneno na cauda
Conduz sim a matilha à segurança
Sabe lamber o rosto de seus filhotes
Sabe estraçalhar a dentadas a ameaça
Aterroriza fere indefere
Sabe se tornar indiferente
Sabe matar as pessoas por dentro

Conhece o melhor e o pior do coração dos homens
O melhor e o pior de si mesmo
Conhece o melhor e o pior das feras
Tenta conhecer o melhor e o pior do mundo.

Sabe que renascerá em breve
E voltará no tempo como um lampejo de novo dia
Fará companhia a aqueles que já partiu um dia
Será o cachorro daquele pirata tatuado
Será o viajante que trará notícias aos sitiados
O samurai que negará a ajuda do seu pai
A lamina forjada pelo ferreiro caído em desgraça
O aprendiz de feitiços no reino das lendas
A flauta do bardo furtador de carcaças

Menino
Será novamente
Pois é como lua
Engendrado em mistério, morte, vida, dor e alegria
Sob a eterna névoa que paira
Sabe que manterá para sempre a confiança
E a trancará no seu coração
Jamais perdera a esperança
Ele diz
Esperança devastadora de um único homem
Sabe aonde vai chegar
Contou os passos na última viagem
É filho do velho caolho
E do pai atento
Da mãe acolhedora
Da cobrança e do hábito

Renascerá
Já está vivo
Caminha entre nós
É lobo novamente
Na verdade
Nunca deixara de ser
Apenas encaminhou a si mesmo e
Sua mente para um lapso de tempo deslumbrante
Onde viveu e morreu uma dezena de vezes
Envelheceu seu espírito e animou seu lado fera

Hoje é garoto
Hoje é adulto
Misto de segredo e sinceridade
Jamais esconde nada de ninguém
Não mente
Mas têm em seus pensamentos seus redutos mais abertos
E ao mesmo tempo mais difíceis de compreender

Olhe-o nos olhos
Imagine
Ele o devorará
Isso é certo
Resta saber se apenas de
Encanto ou deterioramento
Sempre foi
Será

lobo

2 comentários:

diego urbaneja disse...

Grande texto meu velho irmão Ogami! Extenso, vivo, repleto de belas palavras e espírito!

Fudido bixo...


Abraço procê rapá! Nos cruzamos em breve...

Elsa Villon disse...

Já leu o lobo da estepe?

Enquanto não ler, vou perturbá-lo...

Não comento mais dos seus textos, seria mais um elogio repetitivo e eu não gosto de repetições.

Bom texto.
Bom Guri.
Bom Gui.
Bom Origami.
Bom Bra guilhas.